Nosso Senhor Jesus Cristo quis viver na pobreza, mas
nascer de estirpe real; viveu humildemente, mas amou a aristocracia, que é um
dom de Deus
(Da Revista Catolicismo)
Quando se fala em nossos dias de São José — cuja festa a Igreja celebra no dia 19 deste mês — recorda-se frequentemente sua condição de operário, de simples carpinteiro. E ele o foi realmente. Mas há um outro aspecto pouco considerado do pai adotivo de Jesus: sua alta nobreza de nascimento, pois descendia, assim como sua castíssima esposa, da real estirpe de David. “Regali ex progenie Maria exorta refulget” (Maria manifesta-se a nós fulgurante, nascida de uma estirpe real), conforme as belas palavras da Igreja. Uma vez que esse aspecto de Príncipe da Casa de David é pouco associado à pessoa de São José, convém realçá-lo aqui. Fazemo-lo reproduzindo alguns trechos extraídos da obra Nobreza e elites tradicionais análogas nas alocuções de Pio XII ao Patriciado e à Nobreza romana, de Plinio Corrêa de Oliveira.¹
De um sermão de São Bernardino de Siena (1380-1444)
sobre São José:
“Em primeiro lugar, consideremos a nobreza da esposa,
isto é, da Santíssima Virgem. A Bem-aventurada Virgem foi mais nobre do que
todas as criaturas que tenham existido na natureza humana, que possam ou tenham
podido ser geradas. Pois São Mateus (cap. 1), colocando três vezes catorze
gerações, desde Abraão até Jesus Cristo inclusive, mostra que Ela é descendente
de catorze Patriarcas, de catorze Reis e de catorze Príncipes. [...]
São Lucas, escrevendo também no cap. 3 a sua nobreza, a
partir de Adão e Eva, prossegue na sua genealogia até Cristo Deus. [...]
Em segundo lugar, consideremos a nobreza do esposo, isto
é, de São José. Nasceu ele de raça patriarcal, régia e principesca, em linha
reta, como já foi dito. Pois São Mateus (cap. 1) leva em linha reta todos esses
pais desde Abraão até ao esposo da Virgem, demonstrando claramente que nele
desfechou toda a dignidade patriarcal, régia e principesca. [...]
Em terceiro lugar, examinemos a nobreza de Cristo. Ele
foi, portanto, como decorre do que ficou dito, Patriarca, Rei e Príncipe, por
parte de mãe e de pai [...].
Os referidos Evangelistas descreveram a nobreza da
Virgem e de José para manifestar a nobreza de Cristo. José foi portanto de
tanta nobreza que, de certo modo, se é permitido exprimir-se assim, deu a
nobreza temporal a Deus em Nosso Senhor Jesus Cristo”.²
Dos escritos sobre São José, de São Pedro Julião Eymard
(1811-1868):
“Quando Deus Pai resolveu dar o seu Filho ao mundo, quis
fazê-lo com honra, pois Ele é digno de toda a honra e de todo o louvor.
Preparou-Lhe, pois, uma corte e um serviço régio dignos
d’Ele: Deus queria que, mesmo na Terra, o seu Filho encontrasse uma recepção
digna e gloriosa, senão aos olhos do mundo, ao menos aos seus próprios olhos.
Esse mistério de graça da Encarnação do Verbo, não foi
realizado por Deus de improviso e aqueles que haviam sido escolhidos para tomar
parte nele, foram preparados por Ele muito tempo antes. A corte do Filho de
Deus feito Homem compõe-se de Maria e de José; o próprio Deus não poderia ter
encontrado para seu Filho servos mais dignos de estarem junto d’Ele.
Consideremos particularmente São José.
Encarregado da educação do Príncipe real do Céu e da
Terra, incumbido de dirigi-lo e de servi-lo, era necessário que os seus
serviços fizessem honra ao seu divino pupilo: não ficava bem a um Deus, ter que
se envergonhar do seu pai. Portanto, devendo ser Rei, da estirpe de David, faz nascer
São José desse mesmo tronco real: quer que ele seja nobre, até mesmo da nobreza
terrena. Nas veias de São José corre, pois, o sangue de David, de Salomão, e de
todos os nobres reis de Judá e se a sua dinastia tivesse continuado a reinar,
ele [São José] seria o herdeiro do trono e haveria de ocupá-lo por sua vez.
Não vos detenhais a considerar a sua pobreza atual: a
injustiça expulsou a sua família do trono a que tinha direito, mas, nem por
isso ele deixa de ser Rei, filho desses Reis de Judá, os maiores, os mais
nobres, os mais ricos do universo. Também nos registros do recenseamento em
Belém São José será inscrito e reconhecido pelo Governador romano, como o
herdeiro de David: esse é o seu pergaminho real, facilmente reconhecível e leva
a sua régia assinatura.
Mas, que importa a nobreza de José? — direis talvez.
Jesus só veio para se humilhar. Respondo que o Filho de Deus, o qual se quis
humilhar por algum tempo, também quis reunir na sua Pessoa todos os gêneros de
grandeza: Ele também é Rei por direito de herança, pois é de sangue real. Jesus
é nobre, e quando escolher os seus Apóstolos entre os plebeus, Ele os
enobrecerá: esse direito pertence-Lhe, já que é filho de Abraão e herdeiro do
trono de David. Ele ama esta honra de família; a Igreja não entende a nobreza
em termos de democracia: respeitemos, portanto, tudo o que Ela respeita. A
nobreza é de Deus.
Mas então, é preciso ser nobre para servir a Nosso
Senhor? Se o sois, dar-Lhe-eis uma glória a mais; porém, não é necessário, e
Ele contenta-se com a boa vontade e a nobreza do coração. Contudo, os anais da
Igreja demonstram que um grande número de Santos, e dos mais ilustres,
ostentavam um brasão, possuíam um nome, uma família distinta: alguns até eram
de sangue real.
Nosso Senhor compraz-se em receber a homenagem de tudo
quanto é honorífico. São José recebeu no Templo esmerada educação e Deus
preparou-o assim para ser o nobre servidor do seu Filho, o cavalheiro do mais
nobre Príncipe, o protetor da mais augusta Rainha do Universo”³
____________
Notas:
¹ Nobreza e elites tradicionais análogas nas alocuções
de Pio XII ao Patriciado e à Nobreza romana, Editora Civilização, Porto, 1992.
² Sancti Bernardini Senensis Sermones Eximii, vol. IV, in Aedibus Andreae Poletti, Venetiis, 1745, p.
232.
³ Mois de Saint
Joseph, le premier et le plus parfait des adorateurs – Extrait des écrits du P.
Eymard, Desclée de Brouwer, Paris, 7ª ed., pp. 59-62.
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