terça-feira, 30 de abril de 2013

Maomé e sua religião – por Dom Bosco



por Dom Bosco, no livro História Eclesiástica.

(Do blog Arena da Teologia)



 
Nasceu este famoso impostor em Meca, cidade da Arábia, de família pobre, de pai gentio e mãe judia. Errando em busca de fortuna, encontrou-se com uma viúva negociante em Damasco, que o nomeou seu procurador e mais tarde casou-se com ele. Como era epilético, soube aproveitar-se desta enfermidade para provar a religião que tinha inventado e afirmava que suas quedas eram outros tantos êxtases, durante os quais falava com o arcanjo Gabriel. A religião que pregava era uma mistura de paganismo, judaísmo e cristianismo. Ainda que admita um só Deus, não reconhece a Jesus Cristo como filho de Deus, mas como seu profeta.

Como dissesse com jactância que era superior ao divino Salvador, instavam com ele para que fizesse milagres como Jesus fazia; porém ele respondia que não tinha sido suscitado por Deus para fazer milagres, mas para restabelecer a verdadeira religião mediante a força. Ditou suas crenças em árabe e com elas compilou um livro que chamou Alcorão, isto é, livro por excelência; narrou nele o seguinte milagre, ridículo em sumo grau. Disse que tendo caído um pedaço da lua em sua manga, ele soube fazê-la voltar a seu lugar; por isso os maometanos tomaram por insígnia a meia lua. Sendo conhecido por homem perturbador, seus concidadãos trataram de dar-lhe morte; sabendo disto o astuto Maomé fugiu e retirou-se para Medina com muitos aventureiros que o ajudaram a apoderar-se da cidade. Esta fuga de Maomé se chamou Egira, isto é, perseguição; e desde então começou a era muçulmana, correspondente ao ano 622 de nossa era.

Maomé no Inferno: detalhe de afresco da Basílica de S. Petrônio (Bolonha, Itália)


O Alcorão está cheio de contradições, repetições e absurdos. Não sabendo Maomé escrever, ajudaram-no em sua obra um judeu e um monge apóstata da Pérsia chamado Sérgio. Como o maometismo favorecesse a libertinagem teve prontamente muitos sequazes; e como pouco depois se visse seu autor à frente de um formidável exército de bandidos, pode com suas palavras e ainda mais com suas armas introduzi-lo em quase todo o Oriente. Maomé depois de ter reinado nove anos tiranicamente, morreu na cidade de Medina no ano 632. 

Uma Nova Era? Rev. Pe. Bouchacourt.


Uma Nova Era?
Rev. Pe. Bouchacourt

(Do blog Missa Tridentina e Tradição Católica)





Algumas semanas atrás ressoava no alto da loggia de São Pedro em Roma a famosa frase: "Habemus papam!" Acabava de ser eleito o Papa Francisco. Desde então, os meios de comunicação não param de dizer que se inaugurou uma nova era para a Igreja. Com o novo Sumo Pontífice –proclamam– a Igreja de Cristo vai voltar à fonte límpida e refrescante da autêntica pobreza e da simplicidade evangélica. Adeus à mozeta e aos paramentos primorosamente adornados; adeus ao cerimonial pontifical triunfalista e viva o regresso à simplicidade da “Igreja pobre para os pobres”!(1) O mundo aplaude calorosamente, enquanto o seu predecessor Bento XVI é lançado às profundezas do esquecimento, mesmo que ainda vivo.

Esse despojamento iniciado e alentado pelo último concílio, o Vaticano II, parece ter alcançado seu cumprimento com o Papa Francisco, pois, diferentemente de seu predecessor, o novo Papa faz muito poucas alusões diretas ao Vaticano II: simplesmente o vive! É o primeiro sucessor de São Pedro que nunca celebrou a Missa tradicional, já que foi ordenado em dezembro de 1969, poucas semanas depois da imposição do Novus Ordo Missae.

O Cardeal Bergoglio foi um homem totalmente embebido do espírito do concílio, em cuja fonte alimentou seu sacerdócio. Assim como o Vaticano II quis centrar-se inteiramente no homem, o Cardeal centrou também sobre o homem o seu apostolado, orientando-o à luta contra a pobreza, contra a injustiça e contra a corrupção. Fê-lo com um convencimento real, ganhando para si uma grande popularidade entre os desfavorecidos, juntando a isso uma vida simples e austera.

Animado pelo mesmo espírito, na última Quinta-Feira Santa, como “bispo de Roma”, foi celebrar a missa em uma prisão romana de menores para lavar ali os pés de uns jovens prisioneiros, entre os quais duas jovens, das quais uma era muçulmana! Estamos na presença de um populista militante.

Para quem foi o primaz da Argentina, qualquer fasto cria uma barreira entre os pobres e a autoridade, razão pela qual seria preciso simplificar ao máximo tudo o que se possa simplificar... Como, segundo ele, a liturgia tem por finalidade reunir os homens e manifestar-lhes a ternura de Deus, urge suprimir toda solenidade, ouro e incenso, e retornar à simplicidade do Evangelho. Não se trata tanto de uma falta de bom gosto ou de uma ausência de cultura litúrgica, mas da concretização de uma doutrina vivida, aquela que o Vaticano II pregou e que ele aplica com toda a sua lógica.

Este mesmo pensamento é o que vive no Papa Francisco desde sua eleição e que o guia através do diálogo inter-religioso e do ecumenismo, acerca do qual diz que “quer dar-lhe prosseguimento na linha de seus predecessores”.(2) As religiões, sejam quais forem, estão ao serviço do homem e devem unir-se para realizar o plano de Deus sobre a humanidade. Têm de reunir-se e trabalhar juntas para defender as causas universais em perigo, como o respeito pela vida, a ecologia, a paz e a luta contra todas as exclusões que provocam miséria e injustiça.

Esse movimento ecumênico e inter-religioso se orienta à ação, e não pode ser de modo algum um chamamento à conversão para entrar na Igreja Católica, única arca de salvação... No sermão da missa que celebrou diante de seus cardeais no dia seguinte à sua eleição, o Papa pronunciou belas palavras sobre Nosso Senhor Jesus Cristo, fora de quem não pode haver um apostolado fecundo. Sem Ele, disse, “a Igreja não seria mais que uma ONG”. Mas alguns dias mais tarde, durante a reunião em que recebeu os responsáveis de todas as religiões, o Papa Francisco pediu às religiões que se unam para salvar os valores essenciais, sendo que uma grande parte dos chefes religiosos que assistiam não reconhece a divindade de Nosso Senhor Jesus Cristo... Não há aqui uma contradição? Tal contradição é, por desgraça, o próprio do modernismo que São Pio X denunciava. Esse diálogo, saibamos bem, será mais efusivo do que nunca, como já tinha mostrado tantas vezes em Buenos Aires! Ao contrário de seu predecessor, o Papa Francisco já não vai falar da hermenêutica da continuidade do Vaticano II com a Tradição, nem vai tratar de demonstrá-la. Vai assumir sem nenhum complexo essa ruptura que a FSSPX vem denunciando desde sua fundação.

Como se afasta tudo isso da teologia católica ensinada pelos Papas até Pio XII! O Sumo Pontífice, por função própria, deve defender, explicar e transmitir o depósito da fé que recebeu de Cristo. Essas atitudes novas, ensinadas e praticadas desde mais de 50 anos pelos sucessivos Papas, provêm de uma doutrina nova que está em ruptura com o que expressou o Concílio Vaticano I falando da função do Papa: “O Espírito Santo não foi prometido aos sucessores de Pedro para que por revelação sua manifestassem uma nova doutrina, senão para que, com sua assistência,santamente custodiassem e fielmente expusessem a revelação transmitida pelos Apóstolos, isto é, o depósito da fé”.(3)

O Pontífice recém-eleito deve entrar no cargo que recebeu, e não adaptá-lo a seus gostos pessoais. Esse cargo o transcende. Em caso contrário, correria o risco de dessacralizá-lo.

Desde o momento de sua aceitação, o Papa já não pertence a si mesmo. Converte-se em Vigário de Cristo, ou seja, na maior autoridade sobre a terra. O fato de levar as insígnias pontifícias, o fasto do protocolo e das cerimônias a que preside protegem essa autoridade, manifestam os dons que recebeu de Deus e dão alegria e orgulho aos membros da Igreja. Assim se manifesta a virtude da magnanimidade que deve haver no Papa, isto é, sua grandeza de alma, que provém da virtude da fortaleza, da qual tanto vai necessitar para cumprir fielmente sua missão e que terá de mostrar em face de um mondo hostil. Além disso, é necessário que queira ser Papa e não unicamente bispo de Roma... São Tomás de Aquino diz que recusar essas honras legítimas é algo repreensível.(4)

O que não impede que o Romano Pontífice manifeste simplicidade e bondade em suas relações com os demais, pelo contrário. Suas qualidades pessoais e sua santidade devem edificar e servir de irradiação do papado no mundo. Da virtude da magnanimidade deve derivar-se a da magnificência: “ver e fazer grande” para a glória de Deus e honra da Santa Igreja. Assim é como se explica o fasto dos ofícios pontifícios e da liturgia católica, que tem como finalidade honrar a Deus e reproduzir na terra algo da liturgia celestial.

Como o Santo Cura d'Ars possuía essa magnificência, exclamava: “Não há nada que seja belo demais para Deus!” Acaso não teriam os pobres, precisamente porque são pobres, direito de assistir a formosas cerimônias litúrgicas que tributam dignamente glória a Deus e que os elevam por sobre seus infortúnios?

O esplendor da liturgia transcende os séculos e as pessoas. Constitui o patrimônio da Igreja oferecido a todos os seus filhos, para ajudá-los a louvar a Deus e atrair sobre si as divinas bondades. A solenidade da liturgia manifesta a fé que anima a Igreja Católica.

Essa magnanimidade e magnificência brilharam de modo exemplar em São Pio X, que provinha de um meio social modestíssimo. Aceitou todas as honras exteriores devidas a seu cargo em prol do bem da Igreja, ainda que sua humildade pessoal sentisse repugnância por isso, conservando ao mesmo tempo uma pobreza edificante no pessoal.

Seu ensinamento foi de grande firmeza, unida a uma admirável bondade para com os que se aproximavam dele. Sob seu pontificado, a Igreja conheceu uma grande irradiação. Salvou-a de muitos perigos interiores e exteriores, sobretudo do modernismo.

Foi um Papa a que todos amavam e admiravam, sendo respeitado pelas potências, mas temido e odiado pelos inimigos da Igreja, que nunca lhe perdoaram a firmeza doutrinal e diplomática que acabou desbaratando os planos deles. Pois – temos de recordá-lo? – a autoridade não se recebe para agradar aos homens, senão para propagar a verdade e o bem, e denunciar o erro e impedir o mal, tal como ensinava São Paulo: “o príncipe é ministro de Deus posto para o teu bem. Mas se obras mal, treme, porque não é debalde que ele cinge a espada, sendo como é ministro de Deus, para exercer sua justiça castigando o que obra mal”.(5) “Recapitular em Cristo todas as coisas”, como dizia São Pio X, ou seja, trabalhar para a reconstrução do reinado social de Cristo. Trata-se de um programa radicalmente oposto às máximas do último Concílio; é, ademais, o único programa que poderá salvar a Igreja da crise que hoje a abruma e trazer a paz e a prosperidade das nações.

O novo Papa deveria inspirar-se em seu santo predecessor e deveria ter presente ante seus olhos aquelas outras palavras de São Paulo: “Se ainda buscasse agradar aos homens, não seria servo de Cristo”.(6) Bastaria a santidade pessoal de um Pontífice ou de um membro da hierarquia católica para tirar a Igreja da crise? Dom Lefebvre, em seu livro A Vida Espiritual, responde de modo muito claro a essa pergunta:

“Talvez alguém me diga: «o senhor está exagerando! Cada vez há mais bispos bons que rezam, que têm fé, que são edificantes...» Ainda que fossem santos, desde o momento em que aceitam a falsa liberdade religiosa, e por conseguinte o Estado laico, o falso ecumenismo (e com isso a existência de várias vias de salvação), a reforma litúrgica (e com isso a negação prática do sacrifício da Missa), os novos catecismos com todos os seus erros e heresias, eles contribuem oficialmente para a revolução na Igreja e para sua destruição.

“O Papa atual e esses bispos já não transmitem Nosso Senhor Jesus Cristo, mas sim uma religiosidade sentimental, superficial, carismática, pela qual já não passa a verdadeira graça do Espírito Santo em seu conjunto. Essa nova religião não é a religião católica; é estéril, incapaz de santificar a sociedade e a família.

“Uma coisa apenas é necessária para a continuação da Igreja católica: bispos plenamente católicos, que não façam nenhum compromisso com o erro, que estabeleçam seminários católicos, onde os jovens aspirantes se alimentem com o leite da verdadeira doutrina, ponham a Nosso Senhor Jesus Cristo no centro de suas inteligências, de suas vontades, de seus corações, unam-se a Nosso Senhor por meio de uma fé viva, uma caridade profunda, uma devoção sem limites, e peça como São Paulo que se reze por eles, para que avancem na ciência e na sabedoria do «Mysterium Christi», no que descobrirão todos os tesouros divinos. (...) O mal do Concílio é a ignorância de Jesus Cristo e de seu Reino. É o mal dos anjos maus, o mal que encaminha ao inferno”.(7)

Caberia desesperar-se e lamentar-se dessas desgraças de nosso tempo? Claro que não! Isso seria algo estéril e oposto ao espírito católico, pois, como diz a Sagrada Escritura, “abyssus abyssum invocat”,(8) o abismo da prova atrai sobre os que amam a Deus a superabundância da graça. Não se deve desanimar. Como pediu Nossa Senhora de Fátima, rezemos agora mais do que nunca pelo Papa e ofereçamos penitências por ele, para que o Espírito Santo o ilumine, o guia e lhe dê forças para restaurar a Tradição, que é a única que pode salvar a Igreja. Isso constitui um dever para cada um de nós, tanto sacerdotes quanto leigos.

Agora mais do que nunca temos um dever de santidade, para que em meio às trevas brilhe em nossas almas a imagem do Redentor. Cristo deve reinar em nós, em nossos lares e em todas as nossas atividades. Assim é que Deus se deixará comover e se apressará a escutar nossas orações, vendo refletir-se em nossas almas o seu amado Filho.

Finalmente, estudemos os princípios que devem guiar-nos no rude combate da fé no qual estamos envolvidos. Para ajudar-lhes nisso, foi publicado em português o Catecismo católico da crise na Igreja, escrito pelo Padre Gaudron, da FSSPX, que teve grande difusão no distrito da França, e que os ajudará a entender melhor o que é a revolução religiosa que estamos vivendo e lhes proporcionará argumentos para responder às objeções que os outros costumam apresentar contra nós.

Ânimo, queridos amigos! Continuemos todos trabalhando com perseverança no serviço de Cristo Rei, com Fé, Esperança e Caridade, distantes dos rumores e na claridade da verdade. Não nos esqueçamos de que a Páscoa segue muito de perto o Sábado Santo!

A paixão da Igreja acabará na hora que Deus quiser. Não lhes escrevo isso com otimismo ingênuo, senão com confiança nestas palavras de nosso Salvador: “No mundo tereis tribulações, mas tende confiança: Eu venci o mundo”.(9)

Que Deus os abençoe! 


Padre Christian Bouchacourt Superior de Distrito América del Sur

(1) Papa Francisco, 14 de março, discurso aos cardeais no dia seguinte à sua eleição.
(2) Papa Francisco, durante a audiência de 20 de março às diversas confissões cristãs e às outras religiões.
(3) Pio IX: “Pastor Æternus”, 18 de julho de 1870, 4ª sessão do Concílio Vaticano I.
(4) II-IIae, questão 129, artigos 1 e 3.
(5) Romanos, 13, 3-4.
(6) Gálatas, 1, 10.
(7) Dom Lefebvre: “A Vida Espiritual”, prólogo.
(8) Salmo 91, 8.
(9) João, 16, 33.

Cultura, alta cultura, literatura: um Brasil sem referências



(Do blog do Instituto de Filosofia e Educação Clássica Ser Fundamentos)




Ao longo de sua história, a humanidade sempre encontrou motivos para caracterizar cada época de seu desenvolvimento como “essencialmente diferente das demais” – pois o mais provável é que assim o fosse.



Cada sociedade – modernamente digamos: cada país – tem uma face peculiar num dado momento do tempo. Isto é a base da refutação daquela crítica segundo a qual “desde sempre o homem lamenta sua condição no mundo; não há nada de novo em se apontar problemas no que quer que seja”. Ora, de fato, a crítica dos arredores é natural à condição do homem de ser racional e desde os primórdios de suas atividades intelectuais os homens se debruçam sobre o problema dos males no mundo. Mas é preciso assinalar este outro fato: cada momento na história – bem como cada geração em cada particular localidade – apresenta problemas que não se confundem com aqueles gerais da época ou com os que vieram antes, embora necessariamente relacionem-se a estes. Por isso não há nada mais legítimo do que os representantes de cada geração, em cada sociedade ou país, dedicarem-se à crítica de seus arredores mais imediatos, pois certamente encontrarão aí algo de novo a que as críticas anteriores não se podiam reportar.

Este texto tem duas premissas: 1) pensar o Brasil de hoje consiste em identificar os particularíssimos problemas que caracterizam nossa presente sociedade e a localizam dentro do momento histórico global; 2) pensar qualquer sociedade consiste enormemente na análise de seus fatos culturais: antes das instituições políticas e das leis, e seguindo o curso do comportamento típico da sociedade – valores, crenças, opiniões – num dado momento do tempo, tem-se, como um espelho deste, a cultura.

Qual o estado da cultura brasileira atual? O que salta aos olhos quando nos fazemos essa pergunta é um fato impressionante: a ausência cabal, no Brasil de hoje, daquilo que se chama alta cultura. Perceba o leitor que a importância dessa constatação reside em que nela se condensa aquilo que seria o nosso “particularíssimo problema”. Poderíamos igualmente destacar entre nossos males a desonestidade de nossa classe política ou a imoralidade que se vem tentando oficializar legalmente, na esteira de vir ganhando cada vez maior circulação entre o povo. No entanto, esses são problemas que se inserem numa grade de tendências mais ou menos globais. Num país como os Estados Unidos, apesar de o governo estar refém de um programa partidário tão pernicioso quanto o brasileiro, ainda há a dita alta cultura. Mas entre nós… O que se passa?

Entenda-se por alta cultura todas aquelas obras da criatividade humana em que o momento histórico no qual se inserem, bem como os legados da humanidade como um todo, são traduzidos simbolicamente, atendendo a critérios estéticos elaborados pela tradição dos gêneros artísticos; uma obra de arte digna de nota deve remeter-se à tradição que a precede (sejam romances, quadros, peças musicais), não necessariamente filiando-se a ela, mas de algum modo respondendo a ela, ainda que para negá-la. Ora, a principal característica da cultura brasileira atual é um profundo desconhecimento das tradições artísticas, não digo nem do Ocidente, mas mesmo do próprio Brasil, variando da ignorância total ao domínio capenga daqueles critérios estéticos necessários à composição de qualquer obra que almeje um diálogo ativo com os cânones.

Em verdade, associada à parca educação da classe incumbida de produzir nossa alta cultura (a relação de distância quanto às tradições artísticas redunda em falta de educação), verifica-se uma acachapante falta de ambição da parte do artista brasileiro contemporâneo. Isto pode soar contraditório, quando o que mais vemos por aí são homens e mulheres alardeando seus talentos artísticos, seja em revistas culturais (que não são poucas entre nós), em blogs, na televisão ou mesmo pelas ruas.

De fato, a julgar pelas aparências, um marciano que ainda não dominasse em profundidade o conceito de alta cultura acreditaria ter no Brasil um verdadeiro caldeirão cultural, páreo para uma Inglaterra renascentista ou uma Rússia do século XIX. Mas a verdade é que por trás de tanto barulho pouco de efetivamente relevante se salva. E, se assim o é, isto se pode creditar em grande medida à falta de ambição do artista brasileiro: o que em princípio é mera ignorância da tradição torna-se logo em programa de trabalho, e imediatamente se têm manifestos exaltando a espontaneidade, a instantaneidade e a falta de seriedade do que deviam ser obras de arte. Ou seja, o artista brasileiro contemporâneo não almeja um diálogo com os cânones, ao menos não enquanto continuador consciente deles, enquanto autor do que a contemporaneidade legará de canônico ao futuro. Se se disser a um jovem poeta brasileiro que ele escreve pior do que Camões, ele fará uma cara de espanto e dirá “Mas é claro! É Camões!”, ou talvez nem se precise ir tão longe: peça-se ao jovem poeta para competir com um Manuel Bandeira, com um Carlos Drummond, e ele retribuirá com um olhar quase ofendido – ofendido em nome de seus intocáveis predecessores, sobre os quais é sacrílego supor que possam ter nos dias de hoje quem os desafie. E, no entanto, há outro modo de se produzir alta cultura?

Façamos, em tempo, a distinção fundamental entre cultura e alta cultura. Evidentemente, esta está contida naquela. Venho tratando por alta cultura tudo aquilo que, dentro do bojo comum das manifestações da personalidade de um povo – a cultura –, destaca-se pelo refinamento de sua composição e por não ser apenas reflexo do momento cultural, mas que traga em sua estrutura algo de autoconsciência e autocrítica. É essa característica autoconsciente que permite a alguns artistas transcenderem seu momento sociocultural, sendo capazes, entre outras coisas, de parodiá-lo, mesmo estando inseridos nele. Tal capacidade de distanciamento só é possível quando já se empreendeu um verdadeiro estudo do objeto o qual se deseja retratar; do contrário, no caso desse objeto corresponder à realidade circundante, o máximo que se consegue é determinar-se por ele. 
O que ocorre no Brasil de nossos dias é justamente a redução da arte ao 
espontâneo impensado, ou, em outras palavras: há uma contaminação da alta cultura pela cultura, não sendo demasiado identificar mesmo uma total substituição daquela por esta. Um exemplo notório disso é serem tomadas por poesia as letras de canções populares que, como insistia fervorosamente Bruno Tolentino, podem ter muito de poético, mas estão um tanto aquém do poema propriamente dito.  Acontece que a poesia hoje foi reduzida ao status de texto de teor confessional, onde se dá arbitrariamente uma disposição vertical a linhas de prosa quebradas, texto esse que, musicado ou não, não apresenta qualquer particularidade em relação à letra de música. Já a musicalidade própria da poesia, obtida nos metros ritmados e de jogos de rima, é considerada um belo arcaísmo, coisa difícil demais de se fazer, pois demanda estudo, treino e, evidentemente, tempo – o que vai contra as regras da espontaneidade desleixada do poeta contemporâneo.

A literatura é, por excelência, o veículo onde se cristalizam as características de uma sociedade num dado momento. Em seus melhores exemplares, ela não é um mero espelho, mas, como dito anteriormente, apresenta uma visão crítica da realidade que nela se reproduz, o que implica dizer que a boa literatura ajuda a compor a realidade, modificando-a. Daí seu papel crucial para o desenvolvimento das sociedades, pois sintetiza e avalia seus valores e dá ao povo um auto-retrato que nunca deixa de influenciar a psique coletiva.
Cabe-nos então olhar para a arte brasileira contemporânea, dando especial atenção à literatura e perguntando a partir dela: quem somos nós? Porém, eis o dilema: no Brasil deste início de século XXI não há uma literatura que nos represente, que dê conta de nos mostrar enquanto totalidade de um povo, expondo nossas contradições e assinalando nossos pontos fortes, de modo que nela o brasileiro tenha a condensação de sua essência.
Nossa prosa recente, que sai dos blogs para os livros impressos sem perdas ou ganhos, é presa de um subjetivismo inócuo, focalizando protagonistas sem raízes, de todo indiferentes ao fato de pertencerem a circunstâncias maiores que seus umbigos. Quando olhamos para a grande literatura universal – digamos, os gênios russos do século XIX –, vemos, pelo contrário, um esforço incansável da parte dos autores para situar suas personagens no momento histórico, sem com isso comprometer a análise psicológica e a descrição de ambientes imediatos. Mas o jovem ficcionista brasileiro parece recusar-se a tal esforço intelectual e imaginativo; prefere seguir o jorro de uma escrita automática, disfarçada de pós-modernismo combativo, sendo que, até este momento, tudo que tem logrado combater é aquela dama agonizante chamada Literatura Brasileira, que há pelo menos duas gerações não dá o ar da graça pelas bandas daqui.[1]

E, no entanto, raras vezes se viu ausência tão eloquente, capaz, ironicamente, de dizer mais sobre o que somos hoje do que a ficção que tantos escrevem sem obter resultados. Somos, pois, isso: uma sociedade sem autoconsciência, sem superego e totalmente entregue à preguiça dos automatismos do momento.

Nota:

[1] Não há quaisquer exceções? Há, sim; pouquíssimas e notadamente frutos de esforços isolados, que conseguem despontar à revelia do meio cultural geral. Mas, para os fins deste texto, é melhor não alentar o leitor com as exceções: ganhamos mais mantendo o cenho fechado e as esperanças em suspenso, pois em estado de alerta trabalha-se mais e melhor.

Lorena Miranda, graduada em Letras, é mestranda do Departamento de Literatura e Cultura Russa da USP.

Publicado no site da revista Vila Nova.

A estiagem em curso no Nordeste brasileiro: Notas




A região Nordeste do Brasil se vê às voltas com o problema das secas novamente. Todos os esforços prometidos pelos poderes públicos para minorar as repercussões negativas do fenômeno natural, quando não contraproducentes ou inexequíveis, não passam de tardios paliativos para os desdobramentos mais críticos da seca: promessas de indenização pelas perdas, caminhões-pipa aqui e acolá para dessedentar os sertanejos e seus esquálidos rebanhos e coisas do tipo. Medidas contracíclicas para prevenir os males decorrentes da seca? Nada. Afinal de contas, manter os sertanejos reféns da insegurança econômica conseqüente às agruras da seca garante a longevidade da Síndrome de Estocolmo eleitoral movida a assistencialismo que possivelmente reconduzirá Dilma Rousseff ao Palácio do Planalto no ano que vem.


* * *



Nem todos se deixam iludir pelo jogo que os poderes públicos fazem com as mazelas da seca para perpetuação no poder das oligarquias de sempre: na cidade de Campina Grande, um criador de rebanhos protestou despejando as carcaças dos seus animais abatidos pelos rigores da seca diante do Banco do Nordeste.


* * *

Ainda no que toca a Campina Grande, a cidade é notória no Brasil pela sua saudável rebeldia ante os desmandos dos poderes centrais. Em meio ao Nordeste subjugado pela dialética suborno/chantagem do assistencialismo do Partido dos Trabalhadores (PT), Campina Grande destaca-se pela altivez com que manifesta sua resistência ao projeto político dos petistas nas eleições presidenciais. No entanto, não é de agora que o município paraibano expressa sua tenacidade ante os desmandos governamentais. Ao leitor, sugere-se tomar ciência da Revolta do Quebra-Quilos.

* * *

Ao contrário do que muitos pensam, clima semiárido não precisa ser sinônimo de miséria generalizada. No mundo inteiro há cidades prósperas erguidas em meio a climas secos, caso da virtual totalidade do território do Estado de Israel; de Salt Lake City, nos Estados Unidos; e das cidades brasileiras de Petrolina e Juazeiro, pólos de fruticultura exportadora. Desde que atentando zelosamente para os limites estipulados pela Sã Doutrina católica, a exploração econômica das zonas tórridas do Nordeste deve levar em conta as enormes potencialidades e os singulares desafios da natureza local, e não transplantar acriticamente o modelo de dinâmica econômica das regiões de clima ameno para o sertão. Uma boa maneira de se fazer isso passa certamente pela releitura (sob o prisma da Santa Fé) dos pretéritos casos de empreendedorismo local bem sucedido, como o de Delmiro Gouveia.

* * *

A peleja do nordestino com a seca rendeu às artes brasileiras um amplo e vistoso patrimônio literário, musical e pictórico. Dentre todos os artistas que colheram inspirações nos dramas existenciais impostos ao sertanejo pelas severas inclemências das estiagens, Mundividência destaca Elomar Figueira Mello e Xangai.

Elomar Figueira Mello

Elomar, a quem Vinícius de Moraes chamou de Príncipe da Caatinga, é um inusitado compositor cujas criações mesclam o linguajar do homem simples e rústico do sertão com versos alexandrinos, adornando-os com arranjos melódicos que combinam a música popular tradicional do Nordeste, a música medieval ibérica, e a música renascentista. Xangai é o soul mate elomariano por excelência: seu timbre peculiar parece ter sido feito sob medida para interpretar o cancioneiro do trovador-repentista.

Feitas essas observações introdutórias, Mundividência compartilha três composições de Elomar que expressam o desalento do sertanejo com a seca, e também a relação deste com as aguardadas chuvas:

                                                                        CAMPO BRANCO



                                                    CURVAS DO RIO








Ao Braço do Mesmo Menino Jesus Quando Appareceo


Ao Braço do Mesmo Menino Jesus Quando Appareceo

(Gregório de Mattos Guerra)



                                               O todo sem a parte não é todo,

                                               A parte sem o todo não é parte,

                                               Mas se a parte o faz todo, sendo parte,

                                               Não se diga, que é parte, sendo todo.


                                               Em todo o Sacramento está Deus todo,

                                               E todo assiste inteiro em qualquer parte,

                                               E feito em partes todo em toda a parte,

                                               Em qualquer parte sempre fica o todo.


                                               O braço de Jesus não seja parte,

                                               Pois que feito Jesus em partes todo,

                                               Assiste cada parte em sua parte.


                                               Não se sabendo parte deste todo,

                                               Um braço, que lhe acharam, sendo parte,

                                               Nos disse as partes todas deste todo.

COMUNGO A HÓSTIA BRANCA QUE IRRADIAS


COMUNGO A HÓSTIA BRANCA QUE IRRADIAS



(Ângelo Monteiro)


Comungo a hóstia branca que irradias
Como se em mim ó vida fosses maio
E os sinos em seu último desmaio
Ainda repicassem sobre os dias.

Por isso em tuas chamas me contraio,
E em tua forma circular que hostias
Em minha boca, abrindo novas vias,
Eu busco o amor como quem busca o raio.

Elevo sempre as torres derribadas
Para erguer-me de novo às cumeadas
Onde o vôo mais alto amor coroa.

Como se herdando a fluidez dos ares
A esperança acendesse os seus altares
Na comunhão com tudo que se escoa.


JHS



JHS




(Durval de Moraes)

Cruz de carne a sangrar sobre o Calvário.
Fim de vida no céu de um fim de dia...
Silêncio, solidão, treva, agonia,
Vindo os olhos fechar ao Solitário!

Hóstia de expiação da grei sombria?!
Oh! Que loucura, Excelso Visionário!
É quanto restará do teu fadário,
Fria carne a morrer na noite fria?

Dá-me que eu beba, Pecador sem crime,
Nas cinco fontes dessas cinco chagas,
O sangue que alimenta e que redime...

E dando leve pela vida escura,
Entre as bênçãos dos homens e entre as pragas,
Tua Cruz, teu Amor, tua Loucura.

O Islã: Notas


Acossada pelos sucessivos e crescentes abusos das minorias islâmicas, a Noruega resolveu dar uma (tardia) resposta ao proselitismo religioso saudita no país nórdico: os súditos da monarquia de Ryad e seus demais correligionários maometanos só poderão seguir com o envio de recursos financeiros para a construção de mesquitas em solo norueguês caso a Arábia Saudita passe a aceitar a construção de templos de outros credos em seu território. Nos termos do indiferentismo religioso liberal ora hegemônico, a resposta norueguesa é sem dúvida coerente, e traz algum alívio mesmo a residual Cristandade ainda remanescente na Noruega.

* * *

No Brasil, o Islã segue com seu avanço lento e contínuo. Em tempos recentes, foi anunciada a construção de uma mesquita na cidade de Porto Alegre, a ser erguida com dinheiro vindo de Abu Dhabi. Nas favelas dos grandes centros urbanos, a penetração da ideologia Black Panther subjacente à contestatária subcultura rapper norte-americana trouxe consigo a opção pela religião islâmica como forma de resistência política a uma alegada opressão da elite branca cristã contra o negro pobre. No semiárido do Nordeste brasileiro, clérigos islâmicos aliciam sertanejos para a causa do Crescente. Há, portanto, perigo no horizonte: ou os católicos já se esqueceram da Revolta dos Malês? Uma reedição dela que congregasse periferias urbanas sublevadas à la PCC e sertanejos em armas à la Canudos seria tremendamente desastrosa.

* * *

A Península Ibérica sucumbiu às invasões muçulmanas em onze anos, e levou sete séculos para livrar-se do jugo islâmico. Tendo isso em mente, o velho ditado de que prevenir é melhor que remediar assume um apelo  nada desprezível. Sobre o domínio mouro sobre os reinos cristãos ibéricos, Mundividência recomenda uma das vídeo-aulas da Montfort a respeito da Reconquista (aqui e aqui).

* * *

Em sua colossal ojeriza à Cristandade, os talmudistas escolheram o lado dos ímpios maometanos nas guerras entre estes e a nobreza católica na Reconquista. Assim sendo, a distância entre o vasto poderio econômico, midiático e cultural de Higienópolis e o potencial demográfico, missiológico e insurrecional do Islã no Brasil pode ser bem menor que se supõe.

* * *

No auge da era ferroviária do Brasil, nos idos do Segundo Império e da República Velha, as companhias inglesas que espalhavam trilhos pelo estado do Paraná tencionavam resolver o problema da escassez de mão-de-obra mediante a importação de maciços contingentes de curdos muçulmanos do Iraque, minoria étnica sempre indócil ao domínio neocolonial britânico. A idéia das oligarquias inglesas era debilitar a resistência curda no Iraque com a rarefação populacional dos redutos daquele povo na Mesopotâmia, com a vantagem adicional do favorecimento aos lucrativos empreendimentos ingleses no Brasil. A manobra só não teve êxito porque precocemente o povo do Paraná teve ciência da pretensão, e a rechaçou com veemência. Graças a isso o interior do Paraná não é um pseudópodo do Califado, apesar dos bolsões maometanos de Foz do Iguaçu.

* * *

O ímpeto cruzado ibérico, além de livrar Portugal e Espanha do domínio muçulmano, impeliu a ilustre nação lusitana nos seus empreendimentos navais, inclusive a descoberta do Brasil.

Os esforços por dar combate ao Islã (em particular na personificação otomana deste), bem como por subtrair-lhe pela evangelização e pelo batismo as almas dos pagãos, levou Portugal a erradicar a presença do Império da Sublime Porta na costa índica da África e nos arquipélagos dos derredores. Um dos personagens mais memoráveis desse processo foi Cristóvão da Gama, homem a quem incumbiu liderar as forças portuguesas que vieram em socorro do imperador cristão da Etiópia naquela guerra contra somalis e otomanos que poderia ter sido a última.

Embora em ridícula minoria, as forças luso-etíopes impuseram fragorosa derrota aos inimigos. A improvável vitória resultou sobretudo da invulgar coragem dos portugueses: o próprio Cristóvão da Gama sacrificou-se ateando fogo num paiol cheio de pólvora para não permitir-se ser preso quando na iminência da inevitável captura, levando consigo muitos soldados otomanos.

Deve-se sobretudo aos hercúleos esforços de Cristóvão da Gama e de seus comandados o fato de a Etiópia não ter capitulado diante do Islã e seguir sendo até hoje um oásis cristão no deserto muçulmano do Norte da África. A obra portuguesa  na Etiópia possa encontrar o favor da graça divina e ainda vir a frutificar na conversão ao catolicismo daquele país.

* * *

Ainda no que toca à extensão da obra cruzada e missionária de Portugal no Índico, ela foi de tal envergadura que a Diocese de Goa (fundada pelos portugueses), pelo valor e extensão do apoio que dava aos trabalhos de evangelização dos pagãos na Ásia e na costa oriental da África, era conhecida como a Roma do Oriente, tamanha era a abrangência da sua atuação, inferior apenas ao da própria Diocese de Roma.

Nos trabalhos da Diocese de Goa pela expansão da Santa Fé católica nos confins da Terra, destacaram-se São Gonçalo Garcia (franciscano) e São Francisco Xavier (jesuíta). Este, de tanto ministrar o batismo aos pagãos, não raro via extenuadas as forças dos braços. Como sinal do máximo dom oferecido à causa de Cristo pelo jesuíta, o Altíssimo quis preservar incorruptos os braços que a tantos aspergiram as santas águas do batismo.

* * *

A célebre memória do espírito cruzado português, do qual é tão devedora a Cristandade (e mesmo a caricatura laica desta chamada de Ocidente), foi brilhantemente enaltecida pelo poeta Alphonsus de Guimaraens nos versos que Mundividência tem gosto de compartilhar com seus leitores:

BONS TEMPOS

Bons tempos da loriga e da cota de malha,
Quando vós, meus avós das montanhas do Minho,
Balestreiros viris, vermelhos do bom vinho,
Ao sarraceno infiel ousáveis dar batalha!

As loiras castelãs, cheirando a rosmaninho,
Diziam-vos: — "Que Deus, na peleja, vos valha!"
E o saio d'armas era a querida mortalha
Que vos ia cingindo o amplo torso de pinho ...

Combates pela Cruz em campos do crescente!
Fidalgos, infanções, ou gente de mesnada,
Volviam para Cristo o olhar piedoso e crente.

E vós, guerreiros, quando a morte alucinada
Surgia, para vê-la erecta, frente a frente,
Inda erguíeis a heril viseira da celada ...






segunda-feira, 29 de abril de 2013

Legitimidade Católica Proscrita (II): O "Desterro" de São Dominguito del Val, Mártir



 



Por Prof. Pedro M. da Cruz. 
(Do site do blog Sociedade Apostolado)



“Da boca das crianças sai um louvor que confunde vossos adversários, reduz ao silêncio vossos inimigos” (Sal. 8,3)


Magnífica luz resplandecia na noite, junto à ribeira do Ebro, em Zaragoza, Espanha. Aquele fenômeno, qual arauto divino, anunciava aos cristãos uma sublime mensagem celeste. Encontrava-se alí, o corpo terrivelmente mutilado dum “anjo de pureza e heroísmo”, exemplo para os homens do mundo inteiro, mas, particularmente, para as crianças do catolicismo.

Era o ano de 1250. A Espanha claudicava sob o jugo dos mouros, e a Igreja de Cristo, Católica, Apostólica e Romana, avançava com vigor, no firme propósito de converter o mundo ao único Deus verdadeiro. Mas, quem seria aquela criança assassinada com tanto requinte de crueldade? Sua cabeça fora violentamente arrancada; e, inclusive, seus pequeninos pés e mãos haviam sido separados do corpo; em seu peito, via-se aberto certo ferimento, muito semelhante ao de Cristo na cruz... quem, quem seria aquela vítima da maldade humana? Dominguito del Val, o lírio do jardim católico de Espanha, o pequeno menino que, desde os céus, dado o sacrifício de sua vida, abençoaria as crianças do mundo inteiro, e todos aqueles que, com fé, o invocassem fervorosamente.

A dias, havia desaparecido da casa paterna; tal fato, deixara todos em desespero. Naquela época, muitos temiam por seus filhos, pois, pérfidos judeus, destilando ódio contra o catolicismo, costumavam praticar todo tipo de ofensas contra a fé cristã, chegando ao extremo de roubar crianças, a fim de que, durante uma cerimônia macabra, pudessem mata-las por crucificação, escarnecendo, deste modo, a Paixão do Senhor. Fora, exatamente o que se dera com Dominguito del Val ...

Pouco tempo depois, havendo sido encontradas as outras partes do corpo, por fatos, igualmente, milagrosos, soube-se de toda a verdade pela boca de Albayuceto, um dos judeus que participaram ativamente do vergonhoso ritual. “Sim, fui eu. Matai-me. A visão do morto me persegue; já não consigo mais dormir”, dissera, tomado pelas lágrimas, aos que o foram aprisionar. A verdade, é que o santo menino alcançará desde os céus a conversão de Albayuceto, que, agora, batizado no catolicismo e, verdadeiramente arrependido, sofrerá, tranquilo, a punição indicada pela justiça humana.

Imaginemos, boquiabertos, a cena estupenda que se  desenrolara no mundo espiritual. São Dominguito del Val, no esplendor de sua glória, tendo em seu corpo fixadas as marcas do martírio, recebendo, frente aos anjos, seu antigo algoz. Sim, porque, no paraíso celeste, reina somente o amor e a mais terna misericórdia. Albayuceto será testemunha do alto grau a que chegou o pequeno santo de Espanha.

Segundo o mesmo judeu, Dominguito del Val fora capturado   quando voltava da catedral de Zaragoza, onde, sabe-se, participava do coro, e servia o altar durante as santas missas. Era o dia 31 de agosto do ano 1250. O santo coroinha possuía, tão somente, sete anos de vida; gozava ainda os albores da infância... o que, não comoveu o pétreo coração de seus verdugos. Arrastado a um lugar secreto, foi coagido a que negasse a fé cristã, porém, resistiu a tal absurdo com todo heroísmo: “Não, isso nunca - disse o menino- não, mil vezes não.” Tomados de ódio contra a firmeza da criança, puseram-se a repetir com ódio os fatos da Paixão. Crucificaram-no, violentamente, numa parede, coroado de espinhos, com três pregos rasgando seus pés e suas mãos. Dominguito tremia de dor e medo, porém, suplicava à Virgem Maria que o ajudasse durante o martírio. Queria morrer como bom cristão. Finalmente, os judeus abriram seu peito com uma lança, sem dó nem piedade. Assim, fora terminado o ritual ...

Que cena estupenda! Ali, fixo na parede, cabeça baixa, qual Cristo na cruz, soltando seu último suspiro, sem, no entanto, haver negado a fé católica! Exemplo glorioso para as crianças e jovens de hoje que, por muito menos, renegam prontamente o que aprenderam aos pés do altar... Possa, São Dominguito del Val, interceder por nós em hora tão dramática na história do cristianismo.

Retirado o inocente da parede, julgaram por bem arrancarem-lhe a cabeça e outros membros, afim de, não só, serem mais discretos no sumiço do corpo, como, também, dificultarem sua identificação. Partes foram lançadas num poço, enquanto que o resto do corpo, como já o demonstramos, fora enterrado, ocultamente, num lugar afastado.
Coube aos céus o anúncio extraordinário de seu esconderijo. Nada como a luz para significar o quão translúcida era a alma inocente daquela criatura. Dali em diante, os milagres se multiplicaram. O selo divino confirmava a santidade heróica manifestada pelo martírio. Suas relíquias repousam até hoje na Espanha, proclamando a todo o mundo a beleza da fidelidade a Cristo e à Igreja. São Dominguito del Val, filho da Virgem Maria, Rogai por nós!



Referências bibliográficas:

· http://www.mercaba.org/SANTORAL/Vida/08/08-31_S_dominguito_del_val.htm

· http://es.wikipedia.org/wiki/D ominguito_de_Val

· http:// www.churchforum.org.mx/santoral/Octubre/2710.htm

As corporações de mestres (patrões) e aprendizes ditavam suas próprias leis trabalhistas



(Do blog A cidade medieval)




“O exercício de cada profissão era objeto de uma minuciosa regulamentação, que existia principalmente para manter o equilíbrio entre os membros da corporação.


Toda tentativa para embaraçar um mercado, todo esboço de entendimento entre alguns mestres em detrimento de outros, toda apropriação de quantidades excessivamente grandes de matérias-primas, eram severamente punidas.

Nada mais contrário ao espírito das antigas corporações do que os grandes estoques, a especulação ou os “trusts”.
 Era também punido o desvio da clientela dos vizinhos pelo abuso da propaganda.
Entretanto a concorrência existia sempre, mas restrita ao domínio das qualidades pessoais.

O único modo de atrair os fregueses era fazer pelo mesmo preço um determinado produto mais bem acabado e mais perfeito que o dos vizinhos.

Os regulamentos lá estavam, para zelar pela boa execução dos trabalhos, apontar as fraudes e punir os transgressores.

Com este objetivo o trabalho deveria, o quanto possível, ser feito ao ar livre, ou ao menos de modo bem visível.

Tudo devia ser mostrado à luz do dia, na qual o malandro não gosta de permanecer, e onde 'maître Patelin' (espertalhão) não consegue enganar o comerciante ingênuo.

Os mestres-jurados ou guardas de ofício cuidavam também da fiel observância dos regulamentos.

Exerciam severamente o direito de visita.

Os fraudadores eram colocados no pelourinho e expostos juntamente com sua má mercadoria durante certo tempo.

Seus companheiros eram os primeiros em apontá-los, fazendo-os sentir o desprezo de seus confrades, ofendidos pela vergonha que jorrava sobre todo o ofício.

Eram colocados à margem da sociedade.

Por isso os falsificadores eram olhados mais ou menos como os cavaleiros perjuros, que teriam merecido a degradação.”


Fonte: Régine Pernoud, “Lumière du Moyen Âge”, Bernard Grasset Éditeur, Paris, 1944)