sábado, 20 de abril de 2013

Um conservadorismo autóctone





Do blog Acarajé Conservador 

Com a crescente popularidade do conservadorismo em muitos meios, principalmente entre os jovens, fica a pergunta se estamos falando do conservadorismo no Brasil ou do Brasil. Obviamente a importação de autores e escritos, principalmente dos EUA, enriquece profundamente a reflexão e preenche uma triste lacuna que há de uma literatura conservadora. Entretanto, qualquer tentativa de concretização de tais ensinamentos no Brasil, desconhecendo as nuances da nossa sociedade e da sua grande distância dos paradigmas americanos e europeus, será certamente fracassada.

O conservadorismo consciente que se desenvolveu historicamente no Brasil tinha como característica fundante a primazia da fé católica e a sensibilidade diante da amálgama cultural que é a nossa civilização. Pensadores como Gilberto Freyre, Nelson Rodrigues, Gustavo Corção, Alceu Amoroso Lima, Otto Maria Carpeaux etc estavam, direta ou indiretamente, associados com este paradigma. Havia, contudo, um segundo conservadorismo, porém não consciente, que era fruto do espírito maçônico republicano. Entretanto, diferentemente dos seus similares americanos, no Brasil o conservadorismo foi muito mais tímido em sua produção e na sua capacidade de criação de saber e estética. Não obstante a aparente ineficiência, grande parte dos conservadores brasileiros nutria uma visão de mundo realista da nossa história e condizente com as experiências tradicionais da nação.

O fato do conservadorismo americano ter, em sua grande parte, uma matriz cristã o torna mais palatável ao brasileiro. Ademais, as produções mais recentes têm fortes marcas católicas, livres de perigosas percepções protestantes, tão diferentes da nossa sensibilidade. Entretanto, um segundo fator torna a experiência conservadora da América, e também da Europa, profundamente distinta da realidade brasileira. O Brasil diferencia-se por ser uma civilização ocidental tropical, talvez a mais pujante existente. Para cá vieram os europeus mais miscigenados com os selvagens mouros; portugueses que, diferentemente dos espanhóis, não nutriram nenhum ódio avassalador contra a cultura humana árabe. O português, portanto, nem era puramente o descendente dos nórdicos que na península fundaram cidades, nem apenas a extensão do norte da África em solo europeu. Os povos do antigo Condado Portucalense eram loiros e morenos, ruivos e escuros. Assim, portanto, a Europa que aportou na Terra de Santa Cruz estava longe do caráter circunspecto e grave das nações do norte.

Aqui o português encontrou o índio e, mais tarde, trouxe para o Brasil o povo que definiu profundamente as marcas da cultura brasileira: o negro. Tamanho encontro entre raças e tradições tão distintas deu origem a uma nova forma de relacionamento humano e de visão de mundo. Enquanto os escravos enviados para os EUA eram, em sua maioria, oriundos de uma mesma localidade e sem grandes cargas culturais, entre os negros para o Brasil levados estavam muitos membros da aristocracia e realezas africanas, sacerdotes, sábios das mais diferentes regiões. Tamanha erudição fez com que em certas senzalas habitassem homens mais doutos do que muitos brancos das casas-grandes. A influência dos povos africanos ajudou a formar e reformar costumes e hábitos. Até mesmo a língua portuguesa, fundamental na unidade das províncias e na definição das fronteiras, foi  tomada pelo ritmo e suavidade do modo como os negros a falavam. Os filhos do senhor de engenho estavam mais habituados com a forma usada pelas amas-de-leite do que pela normatividade do português europeu ensinada nos colégios.

Tamanha miscelânea deu forma a uma sociedade muito distinta da Europa e da África, uma experiência única. O Brasil, ao ser colonizado pelo português, tornou-se numa nação onde a realidade multicultural, algo muito distinto do uso corrente do termo, foi sintetizada e transformada em cultura própria. Destarte, o conservadorismo que ignora as tradições mais profundas da história brasileira é nada mais do que uma caricatura dos modelos americanos. Sendo, portanto, incapaz de conhecer e reconhecer as experiências tradicionais do seu povo, o conservadorismo se converte em discurso panfletário, romântico e, até mesmo, revolucionário. Entretanto, é necessário não confundir esta leitura com o nacionalismo. Ao pensamento conservador é possível a junção do patriotismo com o olhar crítico fundamentado na busca pela verdade e pela beleza. Deste modo, falar do conservadorismo DO Brasil é entender o pensamento que não abre mão da nossa história e das nossas origens e que, ao contrário, fundamenta-se em tudo isso para defender a ordem espiritual da comunidade.

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